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rovavelmente já ouviu dizer que tem de ter cabeça para recuperar de uma lesão, certo? Mas quando dizem isto referem-se ao cumprimento das regras, cumprir com os tratamentos e que faça tudo certo na recuperação e claro, que de alguma forma consiga superar o desafio que é a lesão. Mas agora pense: E se de facto a nossa cabeça (mente) ajudar a recuperar ou a prevenir ou mesmo acelerar a recuperação da lesão? Já alguma vez pensou nisto desta maneira, ser possível fazer prevenção de lesões por apenas ter uma mente mais forte durante os treinos e competições ou então, no dia em que faz uma lesão conseguir ter uma recuperação otimizada graças ao seu estado mental estar focado no tratamento?
As lesões são uma parte desafiante na vida dos atletas, tanto por uma preocupação constante na prevenção ao longo dos treinos e competições como pela frustração, dor física e incerteza quanto ao futuro que pode causar uma lesão.
Embora muitos atletas pensem que a prevenção e recuperação das lesões assenta unicamente e apenas na componente física, a realidade é que esse pensamento está errado. Logicamente que a reabilitação física é crucial mas o contributo da mente e do treino mental é de extrema importância na recuperação e retorno do atleta às competições.
Vamos então analisar os diferentes momentos em que a nossa mente e a sua preparação podem assumir um papel fundamental na prevenção e recuperação das lesões.
Como pode a mente ajudar na prevenção de lesões?
A integração de habilidades mentais ao treino físico pode reduzir significativamente o risco de lesões e garantir uma prática desportiva mais segura e prolongada. E deve estar a perguntar como se pode introduzir esta integração de habilidades mentais para prevenir as lesões?
A resposta é simples, através do treino mental e a consistência desses treino. O treino mental ajuda os atletas a desenvolverem uma maior consciência corporal, controle das emoções como o stress, ansiedade, aumento da concentração e foco. Ao desenvolver este lado da inteligência emocional o atleta consegue tomar decisões mais acertadas e corresponder às exigências físicas em melhores condições.
Conhece certamente algum atleta que ao longo da época se lesiona e por vezes até mais do que uma vez na mesma época, certo? E normalmente até pensamos que o tipo é azarado, tem pouca sorte, até sabemos que ele treina muito e mesmo assim, tem lesões constantemente. Mas alguma vez percebeu qual é a sua postura quanto ao modo como enfrenta as competições e os treinos? Onde está a atenção dele? O foco? O que ele vem a fazer fora dos treinos?
Vejamos situações de atletas que se podem ver em competição: Um atleta demasiado motivado, com muita vontade de vencer e mostrar resultados, esta vontade faz com que se possa tornar demasiado agressivo, menos cuidadoso com determinados movimentos que tenha de executar, levando a uma lesão por uma má execução ou brusquidade num movimento. Ou então um atleta que vai competir e está mais preocupado com o que o treinador, público, colegas de equipa possam estar a ver e se estão ou não a gostar do que ele está a fazer, com isto ele perde o foco, concentração e facilmente pode colocar a sua integridade física em causa, ao estar a pensar sobre o que está fora do seu controle. Um atleta que sente ou coloca sobre si mesmo demasiada pressão, ao ponto de não a conseguir gerir e durante a competição, dá por si com os músculos demasiados tensos, não conseguindo deixar fluir os seus movimentos, sentindo-se mais preso e com isso, executar erradamente os movimentos que lhe compete.
Analisadas várias situações e é importante compreender que qualquer uma delas, poderá provocar reações no nosso corpo, como a tensão muscular, suores, algumas sensações como “borboletas no estômago”, pernas a tremer entre outras, estas que podem interferir com atleta de forma negativa em certas situações.
Vejamos então na prática como é que algumas das formas de treino mental podem ajudar na prevenção de lesões:
- Aumento da atenção e consciência corporal: O treino mental ajuda os atletas a desenvolverem uma maior clareza sobre o seu estado atual, quer seja físico, comportamental e mental, e ao estarem mais presentes conseguem dessa forma estar atentos ao sinais e sintomas que o seu corpo vai dando, seja a fadiga física ou algum mau estar que possa estar presente. Com efeito, os atletas podem adotar medidas preventivas, como abrandar o ritmo, descansar, ajustar técnicas ou evitar certos movimentos.
- Controlo das emoções: Conforme referido anteriormente, um atleta com treino mental consegue ter uma maior clareza sobre o seu estado mental, demonstrando uma maior inteligência emocional. A inteligência emocional (I.E.) refere-se à capacidade de gerir emoções e de reconhecer e compreender as emoções tanto em nós como nos outros. O termo foi popularizado pelo psicólogo Daniel Goleman em 1995, no seu livro “Inteligência Emocional”.
Os atletas tendem muitas vezes a descrever situações de stress e ansiedade, ambos são respostas emocionais naturais a situações que nos colocam fora da nossa área de conforto e sob a qual sentimos não ter o controle total. Estas duas emoções quando presentes de forma excessiva podem tornar-se prejudiciais para a performance do atleta, aumentando o risco de lesão e podendo mesmo comprometer a sua saúde. O treino mental oferece técnicas que ajudam a gestão destas emoções, destacamos a respiração e visualização , estas que podem levar o atleta a um estado de maior clareza, com efeito mais calmo e reduzir desta forma a tomada de decisões impulsivas ou negligenciar a sua integridade física que o podem levar a uma lesão. - Foco e Concentração: Não estar focado e concentrado pode levar a descuidos e erros técnicos que aumentam a exposição do atleta às lesões. O treino mental procura desenvolver estratégias com o atleta para este se manter focado e concentrado no presente, sem se deixar tomar por distrações externas. Ao conseguir este estado de presença, o atleta consegue potenciar a realização correta de técnicas e evitar movimentos desnecessários e sem rigor, reduzindo o risco de se lesionar.
- Tomada de decisão consciente: O treino mental ajuda os atletas a desenvolverem habilidades de tomada de decisão e o impacto destas habilidades contribuem para uma maior e/ou melhor avaliação dos riscos e benefícios de determinadas ações. Pressupondo uma redução no risco de lesões pelo atleta ter total conhecimento do seu estado atual e ser capaz de tomar decisões mais acertadas face aos seus recursos e competências no momento.
Agora que já percebemos como uma boa gestão emocional pode ajudar na prevenção das lesões, vamos entender como uma lesão pode afetar a performance do atleta.
No livro “Como Ganhar Usando a Cabeça – Um Guia de treino mental para o futebol” de 2012 (recomendamos a leitura deste livro a quem queira saber mais sobre a mente e treino mental, mesmo que não seja o futebol o seu desporto) de Jorge Silvério e Rafi Srebo podem identificar-se algumas reações em comum em atletas lesionados. Claro que nem todos os atletas passam por um processo igual e com as mesmas reações mas em algum momento desde que se contrai a lesão até à sua total recuperação, um atleta irá identificar-se com algumas destas reações:
- Negação: o atleta não acredita no que lhe aconteceu, desvalorizando a lesão e a própria gravidade.
- Raiva: Enraivecido pelo que lhe aconteceu.
- Justificação: Procura uma explicação para o que lhe aconteceu, muitas vezes não assume a sua responsabilidade pelo sucedido.
- Depressão: Compreende a gravidade e quais os próximo passos, podendo entrar num registo de tristeza pela pausa forçada e pelas incertezas quanto ao futuro.
- Aceitação: Aceita a sua condição e começa a focar-se na recuperação e retorno ao desporto.
Uma lesão pode abalar a confiança e a motivação de um atleta. É nesse momento que a capacidade de superação mental se torna um fator determinante. O treino mental oferece ferramentas para lidar com as adversidades, manter o foco no processo de recuperação e cultivar uma mentalidade positiva. Os atletas aprendem a enfrentar os desafios de forma construtiva e a visualizar-se a retornar ao desporto com sucesso. Se considerarmos também que as lesões geram um rol de emoções negativas, como a frustração, tristeza, medo e insegurança quanto ao futuro e que estas podem trazer alguns obstáculos na recuperação, estas e outras emoções que não contribuem para um bem-estar do atleta e deverão ser reconhecidas o quanto antes e após isso, levar o atleta a lidar com elas. As técnicas de respiração e visualização podem entrar aqui como ferramentas fundamentais para acalmar o atleta e ajudar a reduzir o stress, fortalecer o controle emocional e focar-se numa perspectiva positiva para a condução do processo de recuperação.
Como já foi referido anteriormente, a visualização é extremamente importante no treino mental dos atletas na preparação das competições e treinos, e esta técnica pode estender-se igualmente à recuperação das lesões, pois leva o atleta a ativar as os circuitos neurais relevantes que estimulam a cura. A visualização reforça a importância do atleta na sua recuperação e também pode ajudar a manter a sua atividade mental ao nível do desporto mesmo que não esteja a praticar fisicamente no terreno, é uma forma de manter ativa as partes do cérebro que utiliza quando está em competição ou treinos, e assim não tem de abdicar tanto da sua performance física. E ao nível da recuperação vai ajudar a manter os níveis de confiança mais elevados, tanto na recuperação como no desporto.
Os atletas quando se lesionam alteram as suas rotinas, muito por deixarem de frequentar os locais de treino ou deslocarem-se para tratamentos e reabilitação, acabando por vezes a ter mais tempo livre e com isso muitas vezes afastam-se de toda a estrutura, equipa e de alguma forma, isolam-se, ficando muito solitários, aumentando por vezes o diálogo interno dentro de si, este que pode não ser benéfico se o atleta estiver em baixo. Numa fase com tanta alteração e impacto na vida do atleta, ter uma boa rede de suporte ao nível familiar, colegas de equipa, treinador, profissionais de saúde, será importante para fornecer encorajamento, apoio e orientação. O treino mental ajuda a fortalecer essas conexões e a tirar o máximo partido da rede de suporte disponível.
Conclusão
O treino mental é um processo poderoso para os atletas prevenirem e enfrentarem as lesões. Quando se treina a mente, ganha-se capacidades para um controlo maior face a qualquer desafio que possa surgir, indo além do desporto muitas vezes. O treino mental não apenas acelera o processo de recuperação, mas também prepara os atletas para manterem e conseguirem potenciar o seu retorno ao desporto após a lesão, trazendo uma mente mais forte e blindada.
Lembre-se, a mente é um recurso valioso que pode prevenir lesões e impulsionar a jornada de superação das lesões e levar os atletas a alcançarem um desempenho ainda maior do que antes.
O treino mental vai muito mais além de estar bem nas competições e treinos, provavelmente já se tinha dado conta disso. Temos a certeza de que a sua consciência para a importância do treino mental está a crescer e que quando decidir integrar este tipo de treino na sua preparação, irá obter resultados ainda melhores.
Um abraço,
AltaMente